quinta-feira, 31 de maio de 2012

Mortalidade Materna é tema de seminário na Câmara Municipal de BH




Participei ontem, dia 29 de maio, do Seminário pela Redução da Mortalidade Materna, na
Câmara Municipal de Belo Horizonte, representando a ong Bem Nascer, da qual sou a presidente. Alguns ali presentes pediram-me para postar o discurso em meu blog. Aí está a fala de uma mulher, militante pelo parto normal, e que defende a naturalidade da gestação e do parto.
 
"Duas mil mulheres morreram no ano passado por complicações na gestação parto ou puerpério. E até o dia de hoje, mais de mil mulheres já morreram.  Neste momento mesmo, alguma mulher pode estar com pressão alta,  encaminhando-se para o trabalho de parto e pode vir a falecer, aumentando estes números. Sabemos que 92% destas mortes são evitáveis. Todas estas mortes foram intercorrências naturais da vida; distócias que apareceram de repente e levaram a óbitos? Quantas morreram em decorrência de parto dito normal? E das cesáreas,quantas delas foram realizadas para salvar vidas e quantas provocaram a morte da mulher?

Mortes maternas são resultado de imperícia, negligência, desrespeito ou despreparo dos profissionais de saúde que assistem a partos, mas não dão ao parto o tempo necessário. Excesso de intervenções, ocitocina e anestesia de rotina, aplicação de fórceps, episiotomias enormes, verdadeiras mutilações no corpo feminino, excesso de toques invasivos e cesarianas sem indicações precisas. 

 Eu represento as mulheres, mas nem por isto compartilho  com a tese de que a mulher deve ter o direito de optar pela cesárea. Elas não têm conhecimento científico para se auto -indicar uma cirurgia, onde corta-se quatro camadas para se chegar ao casulo, onde nosso filho está, muitas vezes ainda despreparado para nascer.Pesquisas atestam que se corre mais risco de morrer uma cesárea, que no parto normal; no ano passado 52% das mulheres passaram pela cesárea, cirurgias na maior parte das vezes, desnecessárias. Que demandam mais intervenções, medicamentos, UTI neonatal. Saem caras para os sistemas de saúde e convênios. Saem cara para a mulher, intervindo no seu equilíbrio interno, na ecologia do ser humano.

Um dos aspectos é a má assistência, desrespeitosa, apressada, despreparada, sem cuidados  da maioria dos hospitais. Perdeu-se o ritual, o sagrado do nascimento, a unicidade de cada parto. E a mulher passa por todo tipo de violência institucional, vítima de um sistema mecânico, tecnicista, frio, que anda na contramão de todo um movimento internacional a favor do parto normal e das boas práticas; que começa na OMS, passa pelo Ministério, passa pelos estados e chega às capitais. Ainda estão carentes os municípios do interior, que aguardam a chegada da Rede Cegonha ou intervenções mais consistentes do programa Mães de Minas. Em alguns hospitais do interior, há 100% de cesarianas.

Outro fator de mortalidade materna é a deficiência na rede básica de saúde, que aponta falhas no pré-natal. Acredito que a  Rede Cegonha pode fazer diferença no futuro, com o incentivo às mães para que façam pelo menos seis consultas de pré-natal, a mudança de ambiência interna das maternidades, a qualificação dos profissionais para modelo de assistência humanizado ao parto.  Tenho presenciado, no Hospital Sofia Feldman, onde trabalho como jornalista, um intercâmbio  grande entre as maternidades do Nordeste e Amazônia, diretores de maternidades que estão vindo à instituição apreender o modelo de atenção preconizado pelo Ministério da Saúde. Eles chegam e voltam  dispostos a mudar por lá a assistência.  Já  não acredito no Call Center do programa Mães de Minas, que capta as mães  para as consultas, mas que não garante boa assistência na rede básica. A mim, parece um programa oportunista e marketeiro.

O parto sempre foi um evento eminentemente feminino, coisa de vizinha, de comadre, de parteira. Dentre as propostas da Rede Cegonha, concordo plenamente com uma delas: a inserção da enfermeira obstetra no cenário do parto. Enfermeiras são treinadas para acolher, assistir; uma profissão feminina em essência. Já os médicos, são treinados para intervir, e eles são necessários, têm preservado o seu lugar, quando há distócias e necessidade de cirurgias. Creio que se faz necessária uma intervenção na formação dos médicos, porque as mulheres correm risco na mão de profissionais que não sabem assistir, literalmente, assistir a um parto normal. Que não tem equilíbrio emocional para ver uma mulher em trabalho de parto, sem propor uma intervenção, um sorinho, uma anestesia ou que cortam seus períneos, desconhecendo as evidências científicas que já mostraram que dá mais problemas de infecção para a mulher. Nas melhores práticas ela já não ocorre de rotina, apenas quando necessárias.

 Nós mulheres perdemos, neste sistema, inclusive o direito de ter nossos filhos de cócoras, posição natural e fisiológica, na maioria dos hospitais temos que nos deitar, colocar as pernas para cima e, passivamente, deixar o médico se tornar o protagonista do parto. Esse frio sistema que recebe o bebê e rapidamente o entrega para os outros doutores pediatras, para que possam pesar e medir, perdendo-se com estes procedimentos a pele na pele e o olho no olho da mãe com o bebê, tirando da família a oportunidade de vivenciar  este primeiro contato, o reconhecimento do seu filho que acaba de chegar ao mundo.

Algumas mulheres têm sofrido o pão que o diabo amassou em algumas maternidades de Belo Horizonte, principalmente em alguns hospitais escola. Uma delas, relatou em nossa Roda, que ficou em trabalho de parto em dois plantões de estudantes, resultado, viu diferentes médicos introduzirem os dedos para o toque em seu  mais íntimo e privativo espaço.

Aqui em BH, o Hospital Sofia Feldman e o Risoleta  Neves oferecem residência para médicos,que ali aprendem a assistir partos normais e isto é um avanço e vai fazer diferença no futuro. Mas, e os outros que não passam por lá? Que aprendem apenas a fazer cesáreas?  Já é chegado o momento da categoria dos médicos aceitar equipes multiprofissionais e não ficar batendo a tecla de que o parto é um ato médico, o parto é da mulher e este lugar tem que ser preservado. Hoje, dia 30 de maio, é o Dia Nacional  contra o Ato Médico. Quem quiser se posicionar, acesse www.nãoaoatomedico.org.br Nós da ong Bem Nascer, assinamos embaixo.

O parto desejado por nós, mulheres, militantes da causa, é respeitoso, dá valor aos anseios da mulher, respeita o seu protagonismo, utiliza-se das boas práticas, escuta a parturiente e dá ao nascimento o tempo necessário, sem a pressa dos atendimentos nos dias de hoje. Deu  40 semanas, temos que operar, mas, se aquele parto demanda 41 semanas? Deu 38 semanas, já podemos tirar, o nenê está pronto; criando assim seqüelas pulmonares para muitas das nossas crianças. Deu 10 cm, vou passar o fórceps, vou  entrar com ocitocina, a dor aumenta, não tem problema, entramos com anestesia, um efeito cascata e rotineiro em grande parte dos hospitais. Nunca na história da humanidade se interviu tanto na questão nascimento. Creio que a cesárea acaba por deixar seqüelas física, emocionais e psíquicas nas mulheres e suas crianças.

O parto é simples. Demanda silêncio, respeito, cuidado. Uma criança que nasce neste clima, é pacífica, tranquila, o que irá repercutir na harmonia da sociedade, evitando a violência urbana.

Intervir na assistência, qualificar melhor os profissionais de saúde para as boas práticas no parto;investir na formação dos médicos, tudo isto é importante no processo de humanização da assistência ao parto. A ONG mantém um intercâmbio com estudantes da área de saúde e comunicação para sensibilizá-los antes de saírem para o mercado de trabalho. Estudantes de enfermagem da UFMG e PUC ou de jornalismo de outras faculdade freqüentam as Rodas Bem Nascer; ou nós vamos até eles para fazer palestras de esclarecimento. E assim, quando estes profissionais estiverem diante de uma pauta sobre partos ou de um parto, vendo o milagre da vida se repetindo, ele saiba respeitar a mulher, a criança, a família naquele momento, percebendo o nascimento como único e sagrado.

Creio que, se os partos retornassem à sua naturalidade, muitas mortes seriam evitadas e não teríamos que chorar a morte de milhares de brasileiras.

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