DEPOIMENTO DO PARTO
Minha querida “nenenzinha”,
Acabo de entrar em seu quarto e você está dormindo como um anjinho, um anjinho que eu não imaginava...
Há muito quero te escrever, contar-lhe como você veio ao mundo. Esperava chegar o momento ideal, uma hora em que estaria inspirada o suficiente, para conseguir transmitir-lhe toda a emoção que invadiu a nossa casa, naquela noite de 23 de janeiro de 2009.
Eu já estava bastante ansiosa, pois adentrava a 42ª semana de gravidez, período em que não me senti bem. Confesso-lhe: eu queria muito você, mas não gostei de ficar grávida. Ansiava o momento em que você seria colocada em meus braços. Mas acho que você, ao contrário de mim, estava gostando de ficar na minha barriga...
O Dr. Marco Aurélio, médico que me acompanhou no pré-natal, sabendo o tanto que queríamos um parto normal, resolveu descolar a bolsa para apressar o processo, já que, se a demora se prolongasse, haveria o risco de uma cesariana.
Na quarta-feira, 21 de janeiro, fui ao seu consultório e ele colocou tantas agulhas de acupuntura em mim que seu pai disse que eu estava parecendo uma almofadinha de costureira... Mas deu certo. As contrações se fizeram mais freqüentes e perceptíveis.
No dia seguinte, a Mirian, enfermeira obstétrica que me assistiu e que, se tudo desse certo, ajudaria a mim e a seu pai no dia do parto, descolou mais um pouco a bolsa e verificou se, no líquido amniótico, havia a presença de mecônio, o que indicaria sofrimento fetal e impediria que o parto acontecesse na nossa casa, como havíamos planejado. Estava tudo bem! Foi um alívio saber.
Por fim, na madrugada de sexta-feira, 1h30, veio a primeira contração forte. Levantei-me da cama, fui ao banheiro e fiquei sem saber se acordava ou não seu pai, que, bem conheço, gosta muito de dormir... Às 4h resolvi acordá-lo e, cara de pau!, me disse o seguinte: “Olha, você não vai reparar, mas eu sei que isso demora muito, portanto, vou dormir, tá?”. Fiquei um pouco chateada, mas preferia que ele estivesse de bom humor ao acordar do que insistir na sua companhia. Procurei manter a calma, o que não foi muito difícil, pois as contrações, embora intensas, ainda não doíam muito.
Quando seu pai acordou, resolvemos dar uma passada na casa nova, que estava em reforma e, lá chegando, o pedreiro pediu para comprar algumas coisas. Como seu pai queria deixar tudo resolvido antes de você nascer, disse que ia descer até a cidade... Eu fiquei com medo de ficar sem ele na hora “H” e o acompanhei. As contrações continuavam, mas os intervalos eram bem irregulares: 5 minutos, 18 minutos, 40 minutos, 54 minutos, 15 minutos. Me vi tendo de disfarçá-las em plena Loja Elétrica, ou entre estantes de materiais hidráulicos, na Cerâmicas Nacionais Reunidas. Assim também foi na loja Acabamentos Santa Cruz e no Fonte de Minas (restaurante macrobiótico em que conheci seu pai). Sem falar nos solavancos do carro...
Eu tinha uma consulta marcada com o Dr. Marco Aurélio, às 16h30. Ele voltou a colocar as agulhas de acupuntura e acabou de descolar a bolsa. Ao me examinar, disse que daquela noite não passaria e, quando saímos do consultório, desejou-nos um bom parto com um grande sorriso e um olhar de tanta confiança que foi o sinal verde para o trabalho de parto começar.
De fato, lá pelas 18h, quando estávamos indo pra casa, as contrações se intensificaram e os intervalos entre elas diminuíram. Ficamos aguardando intervalos regulares de 5 minutos para ligar pra Mirian, mas eles não ocorreram... As contrações vinham mais e mais rápido, com menos de 3 minutos entre elas, e parecia que você já estava quase saindo... Marinheira de primeira viagem, gritei pro seu pai, que estava no chuveiro: “Liga pra Mirian logo, se não você é quem terá de fazer o parto sozinho”. Ele me obedeceu! Acho que ficou com medo...
Quando ela chegou, aproximadamente 20h, eu já estava desde as 18h em pé, mal conseguindo me controlar diante das dores intensas que vinham com menos de 3 em 3 minutos... Seu pai estava bastante tenso, mas “segurou a onda” e, pelo olhar, me ajudou a pensar que conseguiríamos, pois, em vários momentos, achei que não seria capaz...
Fiquei ali, em frente à janela, não deixando nem ele nem a Mirian se aproximar. A força involuntária indicava, a cada momento de forma mais intensa e frequente, que meu útero queria diminuir de tamanho para você poder nascer. Eu me desesperei, gritei, rezei, desejei ir pro hospital fazer uma cesariana. Sentia um enjôo fortíssimo e, só depois que consegui, com muita dificuldade, vomitar (pois as contrações quase impediam que eu fizesse qualquer coisa), melhorei um pouco. Não por muito tempo. As dores ficaram ainda mais fortes e me dava, às vezes, uma vontade instintiva de agachar, ficar de cócoras, e fazer muita força. O momento se aproximava. Agora posso entender que a expressão da Mirian começou a mudar nesse momento. Na hora, eu, desesperada, não via nada.
Como doía muito, fui para o banheiro. Pensei que a água quente pudesse ter algum efeito anestésico. Se, de um lado, isso era verdade, de outro, não podia suportar nada me tocando, até mesmo a água... A Mirian e seu pai estavam na porta do banheiro. Se entreolhavam e aguardavam o momento, o grande momento...
De repente me pareceu que havia um círculo de fogo em minha vagina. Quis morrer e gritei: “Meu Deus! Se você existe, me deixa te ver, me deixa te enxergar!”. A Mirian dizia que estava por pouco. Não acreditei. Me agachei mais algumas vezes, o que estava ainda mais difícil por causa do círculo de fogo. Mas não demorou muito. A Mirian verificou a dilatação – até então eu não tinha deixado, por causa da dor – e disse que já havia mais de 9 cm. Logo depois você escorregou e eu não acreditei quando te vi: tão linda, tão perfeita.
Você chorou um pouquinho. Queria te colocar no meu colo, no meu peito, te acalentar, mas o cordão era muito pequeno e doía muito forçá-lo. Então eu gritei e pedi pra que o cortassem logo. Assim foi feito. Pelo seu pai, que, logo depois, te pegou toda sujinha e te abraçou e te levou pra nossa cama e ficou lá, chorando, encantado. Eu continuei no banheiro, esperando que a placenta fosse expulsa. Depois disso, a Mirian deixou que saísse um pouco de sangue e me levou pra cama, me deitou. Sentia muito frito e tremia muito. Eles me aqueceram e colocaram você em meu peito.
O que mais me chamou atenção foi a sua força: a força do seu olhar, que me olhava fundo, e a força da sua mãozinha, segurando o meu dedo. Fiquei ali, deitada, com você em meu peito e os dois começaram a me costurar... Levou mais de uma hora e eles se entreolhavam e eu perguntava quantos pontos estavam dando e eles me diziam para não me preocupar com isso naquele momento, o que só me deixou mais preocupada...
Hoje, 3 meses e 10 dias depois, vejo que me preocupei à toa com muitas coisas. Você está aqui, linda, eu estou bem e muito feliz.
Se você viesse de outra forma, ainda assim estaria bem e feliz...
Te disse, no começo, que aguardava o momento ideal para te contar o seu parto, o momento em que estivesse suficientemente inspirada, mas, ao escrever-lhe, percebi que essa hora não chegará. Pude verificar a dificuldade de narrar o que aconteceu. Não sei te dizer por quê. Sei que, logo depois, a impressão que tive foi a de ter feito algo muito maior do que eu. Tentei achar um exemplo para explicar esse sentimento, então eu dizia que essa sensação de ter feito algo muito maior do que eu, algo de que eu não seria capaz, era como se tivesse matado alguém...
Só depois eu pude entender a escolha dessa imagem. Eu, de fato, matei alguém. Matei a mim mesma para que você nascesse e eu também nasci novamente após essa morte de algo que eu nem mesmo sei o que foi. Sei que, tal como você, estou aprendendo as coisas desse novo mundo que você descortinou pra mim e que eu descortinei pra você. Sei que pude, realmente, ver Deus, senti-lo em mim e através de você, perceber a onda de amor que invadiu a nossa casa naquele momento. Me lembro do cheiro que também invadiu a nossa casa, cheiro bom, de sangue e líquidos, de parto. Cheiro de Deus.
Um beijo da mamãe.
Acabo de entrar em seu quarto e você está dormindo como um anjinho, um anjinho que eu não imaginava...
Há muito quero te escrever, contar-lhe como você veio ao mundo. Esperava chegar o momento ideal, uma hora em que estaria inspirada o suficiente, para conseguir transmitir-lhe toda a emoção que invadiu a nossa casa, naquela noite de 23 de janeiro de 2009.
Eu já estava bastante ansiosa, pois adentrava a 42ª semana de gravidez, período em que não me senti bem. Confesso-lhe: eu queria muito você, mas não gostei de ficar grávida. Ansiava o momento em que você seria colocada em meus braços. Mas acho que você, ao contrário de mim, estava gostando de ficar na minha barriga...
O Dr. Marco Aurélio, médico que me acompanhou no pré-natal, sabendo o tanto que queríamos um parto normal, resolveu descolar a bolsa para apressar o processo, já que, se a demora se prolongasse, haveria o risco de uma cesariana.
Na quarta-feira, 21 de janeiro, fui ao seu consultório e ele colocou tantas agulhas de acupuntura em mim que seu pai disse que eu estava parecendo uma almofadinha de costureira... Mas deu certo. As contrações se fizeram mais freqüentes e perceptíveis.
No dia seguinte, a Mirian, enfermeira obstétrica que me assistiu e que, se tudo desse certo, ajudaria a mim e a seu pai no dia do parto, descolou mais um pouco a bolsa e verificou se, no líquido amniótico, havia a presença de mecônio, o que indicaria sofrimento fetal e impediria que o parto acontecesse na nossa casa, como havíamos planejado. Estava tudo bem! Foi um alívio saber.
Por fim, na madrugada de sexta-feira, 1h30, veio a primeira contração forte. Levantei-me da cama, fui ao banheiro e fiquei sem saber se acordava ou não seu pai, que, bem conheço, gosta muito de dormir... Às 4h resolvi acordá-lo e, cara de pau!, me disse o seguinte: “Olha, você não vai reparar, mas eu sei que isso demora muito, portanto, vou dormir, tá?”. Fiquei um pouco chateada, mas preferia que ele estivesse de bom humor ao acordar do que insistir na sua companhia. Procurei manter a calma, o que não foi muito difícil, pois as contrações, embora intensas, ainda não doíam muito.
Quando seu pai acordou, resolvemos dar uma passada na casa nova, que estava em reforma e, lá chegando, o pedreiro pediu para comprar algumas coisas. Como seu pai queria deixar tudo resolvido antes de você nascer, disse que ia descer até a cidade... Eu fiquei com medo de ficar sem ele na hora “H” e o acompanhei. As contrações continuavam, mas os intervalos eram bem irregulares: 5 minutos, 18 minutos, 40 minutos, 54 minutos, 15 minutos. Me vi tendo de disfarçá-las em plena Loja Elétrica, ou entre estantes de materiais hidráulicos, na Cerâmicas Nacionais Reunidas. Assim também foi na loja Acabamentos Santa Cruz e no Fonte de Minas (restaurante macrobiótico em que conheci seu pai). Sem falar nos solavancos do carro...
Eu tinha uma consulta marcada com o Dr. Marco Aurélio, às 16h30. Ele voltou a colocar as agulhas de acupuntura e acabou de descolar a bolsa. Ao me examinar, disse que daquela noite não passaria e, quando saímos do consultório, desejou-nos um bom parto com um grande sorriso e um olhar de tanta confiança que foi o sinal verde para o trabalho de parto começar.
De fato, lá pelas 18h, quando estávamos indo pra casa, as contrações se intensificaram e os intervalos entre elas diminuíram. Ficamos aguardando intervalos regulares de 5 minutos para ligar pra Mirian, mas eles não ocorreram... As contrações vinham mais e mais rápido, com menos de 3 minutos entre elas, e parecia que você já estava quase saindo... Marinheira de primeira viagem, gritei pro seu pai, que estava no chuveiro: “Liga pra Mirian logo, se não você é quem terá de fazer o parto sozinho”. Ele me obedeceu! Acho que ficou com medo...
Quando ela chegou, aproximadamente 20h, eu já estava desde as 18h em pé, mal conseguindo me controlar diante das dores intensas que vinham com menos de 3 em 3 minutos... Seu pai estava bastante tenso, mas “segurou a onda” e, pelo olhar, me ajudou a pensar que conseguiríamos, pois, em vários momentos, achei que não seria capaz...
Fiquei ali, em frente à janela, não deixando nem ele nem a Mirian se aproximar. A força involuntária indicava, a cada momento de forma mais intensa e frequente, que meu útero queria diminuir de tamanho para você poder nascer. Eu me desesperei, gritei, rezei, desejei ir pro hospital fazer uma cesariana. Sentia um enjôo fortíssimo e, só depois que consegui, com muita dificuldade, vomitar (pois as contrações quase impediam que eu fizesse qualquer coisa), melhorei um pouco. Não por muito tempo. As dores ficaram ainda mais fortes e me dava, às vezes, uma vontade instintiva de agachar, ficar de cócoras, e fazer muita força. O momento se aproximava. Agora posso entender que a expressão da Mirian começou a mudar nesse momento. Na hora, eu, desesperada, não via nada.
Como doía muito, fui para o banheiro. Pensei que a água quente pudesse ter algum efeito anestésico. Se, de um lado, isso era verdade, de outro, não podia suportar nada me tocando, até mesmo a água... A Mirian e seu pai estavam na porta do banheiro. Se entreolhavam e aguardavam o momento, o grande momento...
De repente me pareceu que havia um círculo de fogo em minha vagina. Quis morrer e gritei: “Meu Deus! Se você existe, me deixa te ver, me deixa te enxergar!”. A Mirian dizia que estava por pouco. Não acreditei. Me agachei mais algumas vezes, o que estava ainda mais difícil por causa do círculo de fogo. Mas não demorou muito. A Mirian verificou a dilatação – até então eu não tinha deixado, por causa da dor – e disse que já havia mais de 9 cm. Logo depois você escorregou e eu não acreditei quando te vi: tão linda, tão perfeita.
Você chorou um pouquinho. Queria te colocar no meu colo, no meu peito, te acalentar, mas o cordão era muito pequeno e doía muito forçá-lo. Então eu gritei e pedi pra que o cortassem logo. Assim foi feito. Pelo seu pai, que, logo depois, te pegou toda sujinha e te abraçou e te levou pra nossa cama e ficou lá, chorando, encantado. Eu continuei no banheiro, esperando que a placenta fosse expulsa. Depois disso, a Mirian deixou que saísse um pouco de sangue e me levou pra cama, me deitou. Sentia muito frito e tremia muito. Eles me aqueceram e colocaram você em meu peito.
O que mais me chamou atenção foi a sua força: a força do seu olhar, que me olhava fundo, e a força da sua mãozinha, segurando o meu dedo. Fiquei ali, deitada, com você em meu peito e os dois começaram a me costurar... Levou mais de uma hora e eles se entreolhavam e eu perguntava quantos pontos estavam dando e eles me diziam para não me preocupar com isso naquele momento, o que só me deixou mais preocupada...
Hoje, 3 meses e 10 dias depois, vejo que me preocupei à toa com muitas coisas. Você está aqui, linda, eu estou bem e muito feliz.
Se você viesse de outra forma, ainda assim estaria bem e feliz...
Te disse, no começo, que aguardava o momento ideal para te contar o seu parto, o momento em que estivesse suficientemente inspirada, mas, ao escrever-lhe, percebi que essa hora não chegará. Pude verificar a dificuldade de narrar o que aconteceu. Não sei te dizer por quê. Sei que, logo depois, a impressão que tive foi a de ter feito algo muito maior do que eu. Tentei achar um exemplo para explicar esse sentimento, então eu dizia que essa sensação de ter feito algo muito maior do que eu, algo de que eu não seria capaz, era como se tivesse matado alguém...
Só depois eu pude entender a escolha dessa imagem. Eu, de fato, matei alguém. Matei a mim mesma para que você nascesse e eu também nasci novamente após essa morte de algo que eu nem mesmo sei o que foi. Sei que, tal como você, estou aprendendo as coisas desse novo mundo que você descortinou pra mim e que eu descortinei pra você. Sei que pude, realmente, ver Deus, senti-lo em mim e através de você, perceber a onda de amor que invadiu a nossa casa naquele momento. Me lembro do cheiro que também invadiu a nossa casa, cheiro bom, de sangue e líquidos, de parto. Cheiro de Deus.
Um beijo da mamãe.
Rita
Por favor, você poderia me passar o nome completo do Dr. Marco Aurélio para que eu possa procurá-lo, estou grávida e procuro por um médico que me apóie na minha decisão por parto natural, Muitíssimo obrigada! Vanessa vanessac.deabreu@gmail.com
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